Um melhor transplante de medula óssea: previnindo a doença de enxerto-contra-anfitrião (GVHD)
ANN ARBOR—O transplante de medula óssea é um tratamento chave para pacientes com leucemia, linfoma, mieloma múltiplo e outras desordens do sangue.
Pesquisadores da Universidade de Michigan descobriram que a inibição de um caminho sinalizador em algumas células transplantadas pode prevenir as complicações potenciais mais sérias do procedimento, um conflito entre as células transplantadas e o próprio tecido do paciente chamado doença de enxerto-contra-anfitrião.
Em um estudo planejado para ser publicado online no dia primeiro de Março, no Jornal de Investigação Clínica, o médico Ivan Maillard, membro do Instituto de Ciências da Vida (LSI) da U-M, explica como um caminho de comunicação de célula-a-célula conhecido como Via de Sinalização Notch desempenha um papel crítico na doença de enxerto-contra-anfitrião e os detalhes de como os anticorpos que inibem os elementos específicos da Via Notch podem prevenir a doença de enxerto-contra-anfitrião em camundongos — sem efeitos colaterais sérios e sem comprometer substancialmente a capacidade de luta contra o câncer das células transplantadas.
Depois do transplante de medula óssea, as células tronco do doador substituem as células tronco doentes ou deficitárias do paciente. Uma vez que o paciente recebe a nova medula, as células do doador começam a produzir células sanguíneas vermelhas e brancas saudáveis. Ao mesmo tempo, as células imunes do doador, chamadas T, podem reconhecer e destruir as células de tumor do paciente, que é o principal efeito benéfico do procedimento em pacientes com câncer.
Entretanto, na doença de enxerto-contra-anfitrião, as células T do doador também reconhecem os tecidos normais do recipiente como ‘estrangeiro’ e começam a atacar alguns órgãos como o intestino, o fígado, os pulmões e a pele.
“Isto pode provocar um dano severo, uma ameaça à vida,” disse Maillard.
Os métodos convencionais para prevenir a doença incluem a remoção das células T do doador de enxerto e o tratamento do paciente com drogas imunorepressivas globais.
“Infelizmente, isto só funciona em uma fração dos casos e também reduz a capacidade das células imunes do doador de reconhecer e destruir as células cancerígenas do paciente,” disse Maillard. “Então há a necessidade de uma intervenção diferente para prevenir a doença de enxerto-contra-anfitrião sem comprometer os efeitos do transplante contra o câncer.”
Inibir a via sinalizadora Notch pode ser a nova intervenção que previne a doença. O laboratório de Maillard está estudando a via Notch devido a suas funções variadas no sangue e no desenvolvimento dos linfócitos, como também em certos tipos de câncer. O atual estudo explora uma nova função da via Notch que transmite o que foi descoberto na regulamentação das respostas da célula T depois do transplante de medula óssea.
Para descobrir que uma das funções da via Notch é regular a resposta da célula T, que causa a doença de enxerto-contra-anfitrião, os pesquisadores experimentaram bloquear a sinalização da via Notch em camundongos para prevenir a complicação. Mas a inibição de Notch em todas as partes do corpo provocou efeitos colaterais significantes, em particular no intestino.
“Isto sugere que a inibição global de todos os sinais de Notch não seja segura depois do transplante de medula óssea,” disse Maillard.
Os pesquisadores focaram ainda mais nesse estudo. Os sinais de Notch são mediados pela interação entre cinco moléculas e quatro receptores nas membranas da célula.
“Desde que muitos receptores e moléculas foram descritos em seres humanos e camundongos, em princípio o estudo foi muito complexo e altamente redundante,” disse Maillard. “Mas fomos capazes de identificar duas moléculas e dois receptores que prestam contas de todos os efeitos da via Notch em GVHD, com um papel dominante para somente um par de molécula-receptor.
Aquele par de molécula-receptor é o objetivo da inibição. Maillard colaborou com a companhia de biotecnologia Genentech, um membro do Grupo Roche, que tinha desenvolvido anticorpos para bloquear moléculas e receptores individuais da via Notch. Quando os pesquisadores usaram anticorpos para inibir as moléculas de Notch, os camundongos não tiveram nenhum dos efeitos colaterais gastro-intestinais que vieram com a inibição global de Notch. E eles não desenvolveram a doença de enxerto-contra-anfitrião.
“Importantemente, o bloqueio de Notch não impediu a eficiência das células T do doador no reconhecimento e na destruição das células cancerígenas, que é o principal gol do transplante de medula óssea nos pacientes humanos,” disse Maillard.
E o tratamento só foi necessário a curto prazo, embora seus efeitos benéficos durassem por mais tempo.
“Isto sugere que haja um pulso da via Notch sinalizando as células imunes imediatamente depois do transplante que apresenta uma janela de tempo para a intervenção,” disse Maillard. “Se pudermos bloquear aquele pulso, poderíamos induzir benefícios de longo prazo sem a necessidade de bloquear a via Notch permanentemente.”
Os efeitos do bloqueio de Notch podem ser traçados para reduzir a inflamação como também bem aumentar a expansão de uma espécie especial das células T, chamadas células T reguladoras, que suprimem a doença de enxerto-contra-anfitrião, ele disse.
‘Essas descobertas abrem perspectivas para estudar a inibição de Notch no tratamento de desordens mediadas da células T, inclusive a doença de enxerto-contra-anfitrião em pacientes,” disse Maillard. “O próximo passo será definir o enfoque e a agenda da inibição que mais chances de ter sucesso em pacientes.”
O laboratório de Maillard também está investigando os mecanismos da ação de Notch em células T e se ele também desempenha um papel importante em outras desordens imunes mediadas pela célula T, como múltipla esclerose e outras doenças autoimunes.
Maillard é professor assistente de pesquisa do Instituto de Ciências da Vida, onde seu laboratório está localizado e toda sua pesquisa é conduzida. Ele também é professor assistente na Divisão de Oncologia – Hematologia da Escola de Medicina da U-M e médico no Centro Compreensivo de Câncer da U-M.
Os co-autores do estudo da Universidade do Michigan foram Ivy Tran, Ann Friedman e Gloria Shan do Instituto de Ciências da Vida; Alexis Carulli, Pavan Reddy e Linda Samuelson da Escola de Medicina; Batize Ebens e Vedran Radojcic do Instituto de Ciências da Vida e Escola de Medicina; Ashley Sandy do Instituto de Ciências da Vida e do Programa de Pós-graduação de Imunologia; e Jooho Chung do Instituto de Ciências da Vida, do Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular e da Escola de Medicina.
Os co-autores de Genentech foram Christian Siebel e Amy Shelton do Departamento de Biologia Molecular e Minhong Yan do Departamento de Biologia de Tumor e Angiogenesis. Thomas Gridley do Instituto de Pesquisa Médica de Maine também foi co-autor.
O suporte da pesquisa foi dado por uma premiação de Inovação da Sociedade Americana de Hematologia Damon Runyon-Rachleff e dos Institutos Nacionais da Saúde.